“Tá vendo essa mulher com uma cesta de flores? É nossa avó Mônica. Era francesa e cultivava copos de leite nesse quintal”, essa frase foi dita por João Lazzarotto ao colunista José Carlos Fernandes da Gazeta do Povo.
Dizem que nos menores frascos estão os melhores perfumes. Hoje não falarei sobre um marco da nossa arquitetura, mas sobre uma modestíssima casinha de madeira que observada de fora não se poderia determinar o seu valor, mas guardando todas as proporções, penso poderíamos chamá-la de a “Capela Sistina” curitibana, pois o seu teto está tomado de desenhos do nosso artista maior, Poty Lazzarotto.
Lendo em 2011 o livro de Valério Hoerner Júnior, “Ruas e Histórias de Curitiba”, descobri muito sobre Curitiba. Uma grande parte do livro é dedicada a contar a história do Vagão do Armistício, não aquele onde a Alemanha assinou o tratado de paz no final da primeira grande guerra e onde Hitler, como revanche, fez a França assinar sua rendição durante a segunda grande guerra.
O vagão em destaque no livro trata-se de uma pequena casa de madeira que um dia fora estábulo e que em 1937 foi transformado numa cantina por Isaac Lazzarotto e sua esposa Julia Tortato, pais do maior ilustrador do Brasil e o mais conhecido artista plástico que Curitiba já produziu: Poty!
Se considerarmos que somente a partir de 1950 Santa Felicidade passou a ser conhecida como centro de gastronomia italiana, podemos dizer que dona Julia foi quem introduziu pela sua pequena cantina o risoto em Curitiba. Ali em princípio apenas para o pessoal do exército, eram servidos radicci, polenta brustolada e o risoto, para não mais do que 40 bocas, pontualmente as 19 horas.
Lendo o livro e vendo as fotos, imaginava que o vagão há muito havia se perdido no tempo. Sabia que o irmão mais novo de Poty, João Lazzarotto, proprietário do Cartório Cajuru, mantinha no cartório uma verdadeira exposição permanente de obras do irmão, o que torna esse cartório único e sem dúvida, candidato a uma visita (tenha ou não um reconhecimento de firma por fazer).
O que eu não sabia na época era que no local onde funciona o cartório, era onde vivia a família Lazzarotto e nesse mesmo local, funcionava o Vagão do Armistício e que ele ainda existia e era (ainda é) mantido com todo carinho pelo Sr. João Lazzarotto, que pessoalmente autorizou que eu o visitasse mais de uma vez, sozinho ou acompanhado, para fazer diversas imagens, algumas das quais compartilho aqui.
Conversei na época brevemente com o Sr. João e disse ele que seus avós em 1850 compraram essa grande área onde hoje está instalado o cartório. Ali, seu avô e seu pai, trabalharam na rede ferroviária e sua avó, tinha uma licença para plantar e comercializar flores. Uma área enorme era tomada pelos seus copos-de-leite, que seu João ajudava a colher. Bem mais tarde, o restaurante no Vagão do Armistício passou a ser tocado pela Dna. Júlia e o seu Isaac, até 1950, numa história que se entrelaça com a história de Poty, da gastronomia, cultura e política de Curitiba.
Quanto ao nome, conversei com o Sr. João e ele me disse que o local foi batizado pelos militares que durante a segunda grande guerra, frequentavam o local para comer um bom risoto e depois, discutiam a guerra, tendo uns a favor de um lado e outros, a favor de outro, mas sempre na paz!
Não sei por quanto tempo o Vagão do Armistício ainda existirá, mas seria incrível que fosse para sempre preservado e restaurado, pelo muito que representa para a história de Curitiba.
Fotografias: Washington Takeuchi